O dia estava ensolarado. Em seu quarto haviam estátuas, cofres e todas as paredes estavam pintadas: uma arte particular feita por uma garota aparentemente feliz.
Ninguém sabia o motivo que a levou cometer tal desatino, jogando-se da janela do quinto andar. Aquilo, aos olhos alheios, não era fácil de se entender.
— Dorme agora! É só o vento lá fora — sussurrava a mãe ao lado do caixão.
Tudo era muito estranho, pois ela só queria colo, coisa que nem os pais entendiam. Às vezes, pensava em fugir de casa, e quase sempre perguntava aos mais próximos:
— Ei, posso dormir aqui com você?
Ela tinha medo e muitos pesadelos, e por tais motivos, permitia-se dormir depois das três, empenhando-se num tempo menor de sonhos ruins.
— Um dia, quando tiver um filho, darei a ele nome de santo — disse, encarando a si dentro do caixão. — Escolherei o nome mais bonito.
Tristeza.
Desesperança.
Loucura.
Sentimentos intensos que a deixaram espiritualmente desvairada.
Ela sabia que era preciso amar as pessoas de outra forma, ou seja, como se não houvesse amanhã. E que se parasse pra pensar, continuaria transloucada.
Ela queria saber por que o céu era azul.
Ela queria explicações sobre a fúria do mundo.
Ela ansiava saber por que tivera como missão fazer o papel dos pais, quando, na verdade, deveria ser a filha.
Ela morava com a mãe.
Ela morava com o pai.
Ela pedia a todos para que a visitassem.
Ela se cansou e passou a morar na rua.
Ela não tinha ninguém.
Ela passou a morar em qualquer lugar.
Como uma andarilha, morou em tanta casa que nem se lembrava mais. E, em alguns momentos, imaginava morar novamente com os pais.
Ela era a gota d'água.
Ela era o grão de areia.
Ela vivia repetindo que os pais não a entendiam, mas era ela que não entendia os pais.
Ela culpava os pais por tudo, e achava isso um absurdo.
"Eles são crianças como eu!", perdia-se em devaneios.
Já ciente de sua condição espiritual, permitiu-se questionar-se:
!O que seremos quando crescer?!
Já não era tempo de pensar no futuro.
Ela não era mais a gota d'água e nem mesmo o grão de areia.
E ainda culpava a si e aos pais.
— Dorme agora! É só o vento lá fora. — Agora era o pai quem dizia as palavras.
O caixão se fechou.
E ela continuou a questionar-se sobre o céu azul e a fúria do mundo.
[Texto de]: Simone Pesci
TÔ MORTA COM ESSE TEXTO!
ResponderExcluirAMEEEEEEEEEI!
Amigaaaaa, é mais forte do que eu! Escutar Legião Urbana me dá vontade de escrever. S2 Fico feliz que gostou do texto. \o/\o/\o/
ExcluirBeijossssss